Mujica Vive

 



Mujica Vive 

  Vanessa Maria de Castro 


A morte de José “Pepe” Mujica marca o fim de uma presença física, mas não de uma trajetória. Porque há vidas que não se encerram com a morte — seguem pulsando como exemplo, como ideia, como força política e ética. Mujica é uma dessas vidas.


Militante desde a juventude, Mujica viveu sob a ditadura, passou doze anos encarcerado em condições brutais, enfrentou a repressão com coragem, e saiu da prisão sem negociar os princípios que o levaram até ali. Ele não fez concessões. Não suavizou o discurso. Não adaptou sua trajetória à conveniência. Ele escolheu permanecer fiel àquilo em que acreditava: justiça social, dignidade, soberania popular, democracia real.


Essa coerência radical — no sentido mais profundo da palavra radical, de raiz — é o que define sua travessia. Mujica não falava uma coisa e vivia outra. Ele encarnava, no cotidiano, aquilo que defendia nas ruas, nas urnas, nas assembleias. E é essa inteireza que o torna símbolo: não um símbolo da modéstia, mas da integridade política.


Num tempo marcado pela corrosão dos sentidos da democracia e pelo cinismo institucional, Mujica se manteve inteiro. Com lucidez, com firmeza, com uma ética que não se deixava capturar por narrativas fáceis. Fez política como quem cuida da terra: com paciência, com resistência e com fidelidade às raízes.


Hoje, sua partida nos convoca à reflexão — não como lamento, mas como celebração de uma vida vivida em coerência. Uma vida que jamais se separou dos sonhos da juventude. Uma vida que não se curvou.


Mandela ficou 27 anos preso. Mujica, 12. E tantos outros, tantas outras, também foram encarcerados e seguem sendo. Mas o cárcere não calou Mujica. Ele saiu e construiu um legado. Um projeto de mundo. Uma aposta permanente na dignidade humana.


Seguiremos sonhando com ele. Não como nostalgia, mas como horizonte. Porque Mujica vive em cada gesto radical de liberdade.



Cronograma da vida de José “Pepe” Mujica


  • 20 de maio de 1935 – Nasce em Montevidéu, Uruguai.
  • Anos 1960 – Ingressa no Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros (MLN-T), grupo de resistência armada de esquerda contra a desigualdade social e a repressão no Uruguai.
  • 1972 – É capturado e preso pelas forças militares uruguaias.
  • 1973–1985 – Durante a ditadura civil-militar, permanece encarcerado por aproximadamente 12 anos, em condições extremamente precárias, inclusive em solitárias.
  • 1985 – É libertado com a anistia concedida após a redemocratização do país.
  • 1989 – Participa da fundação do Movimento de Participação Popular (MPP), dentro da coalizão de esquerda Frente Ampla.
  • 1994 – É eleito deputado nacional.
  • 1999 – É eleito senador.
  • 1º de março de 2005 – Assume o cargo de Ministro da Pecuária, Agricultura e Pesca no governo de Tabaré Vázquez.
  • 2005 – Casa-se com a companheira de militância e senadora Lucía Topolansky.
  • 29 de novembro de 2009 – É eleito presidente do Uruguai no segundo turno das eleições presidenciais, com 52,6% dos votos.
  • 1º de março de 2010 – Assume como 40º presidente da República Oriental do Uruguai.
  • 2010–2015 – Durante seu mandato, implementa políticas progressistas emblemáticas, como a regulação da maconha, o casamento igualitário e a descriminalização do aborto.
  • 20 de outubro de 2020 – Renuncia ao Senado e se retira da vida política institucional, mencionando motivos de saúde e idade avançada.
  • Abril de 2024 – É diagnosticado com câncer de esôfago.
  • 13 de maio de 2025 – Falece em Montevidéu, aos 89 anos.




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